VENTILAÇÃO MECÂNICA NA
LESÃO PULMONAR UNILATERAL: ABORDAGEM FISIOTERAPÊUTICA
Autor:: Alessandra Pezzi Teixeira
CREFITO:: 38479
email: (lepezzi@bol.com.br)
cidade: São Paulo
Instituição: Hospital Santa Cruz
Orientador:: Rodrigo Tadini
Introdução: A ventilação mecânica
tem sido utilizada há muitos anos como recurso importante para salvar vidas na
unidade de terapia intensiva, tendo como objetivo principal manter oxigenação
e ventilação adequadas às necessidades do paciente. Sua utilização
iniciou-se em 1950 nas epidemias de poliomielite com o "pulmão de aço"
que exercia uma pressão negativa sobre o tórax, em 1960 foi criado o BIRD MARK
7 sendo o primeiro ventilador com pressão positiva utilizado em UTI, em
1970 foi criado o primeiro ventilador volumétrico ( Bennetti ), em 1980
surgiram os ventiladores microprocessados, já em 1990 surgiram as válvulas (
mecatrônicas ) e em 2000 a monitorização ventilatória facilitando a
compreensão das condições do paciente e, conseqüentemente, um manejo
ventilatório mais adequado. ( Carvalho, 2000).
É de fundamental importância que o objetivo da ventilação mecânica seja
atingido sem causar danos ao sistema respiratório e alterações hemodinâmicas
que comprometam o estado geral do paciente. Um dos principais efeitos deletérios
relacionados à ventilação mecânica é a lesão pulmonar induzida pelo uso
com ajustes de parâmetros inadequados. (Rodrigues, 2002).
Nesse sentido, começam a surgir dúvidas na prática clínica com relação à
utilização de ventilação mecânica na lesão pulmonar unilateral, e de qual
seria a melhor conduta para o fisioterapeuta intensivista quando encontra essa
alteração pulmonar.
Objetivo: Demonstrar o
mecanismo da lesão pulmonar unilateral, abordando aspectos relacionados à
ventilação mecânica, formas de tratamento que melhorem o quadro clínico de
pacientes com lesão pulmonar unilateral que possam ser realizadas pelo
fisioterapeuta intensivista.
Descrição: :
I. Lesão pulmonar unilateral
É uma lesão assimétrica do parênquima pulmonar, que ocasiona alterações de
ventilação e/ou de oxigenação, que podem se apresentar de duas formas:
- puramente unilateral: apresenta áreas de lesão unilateral bem delimitadas e
definidas.
- predominantemente unilateral: apresenta áreas de lesão bilateral, mas com
predominância unilateral. (Carvalho, 2000 - Blanch, 1992 )
II. Mecanismo da lesão pulmonar unilateral
Por se tratar de uma lesão assimétrica, encontramos um pulmão lesado,
apresentando baixa complacência, alta resistência, levando a uma dificuldade
ventilatória, formando áreas de shunt, gerando hipoxemia e um pulmão
sadio apresentando mecânica respiratória normal.(Knobel, 1998).
III. Ventilação mecânica
A ventilação mecânica na lesão pulmonar unilateral tem como objetivo
diminuir a hipoxemia melhorando a ventilação regional, usualmente unilateral
das regiões consolidadas e colapsadas do pulmão afetado.( Blanch, 2003.).
III. a - Ventilação mecânica convencional
A mensuração global da mecânica
respiratória em lesão pulmonar unilateral, não fornece clinicamente informações
úteis para ajustar os parâmetros ventilatórios ( PEEP e VC ), devido à
deterioração mecânica de partes lesadas do pulmão que não podem ser
avaliadas especificamente.
Sendo assim, a aplicação de pressão positiva pode distender excessivamente o
pulmão não envolvido, com maior complacência pulmonar e desviar o fluxo
pulmonar para o pulmão acometido, desse modo piorando a relação V/Q e
diminuindo a oxigenação. PEEP moderado com volume corrente baixo pode não
aliviar a hipoxemia porque não gera uma pressão intratorácica necessária
para abrir a região colapsada ou o parênquima pulmonar consolidado.
Contrariamente, um volume corrente alto combinado com uma PEEP de alta a
moderada pode resultar em uma pressão torácica alta o suficiente para abrir
efetivamente áreas pulmonares colapsadas, embora distensão excessiva de áreas
pulmonares não acometidas possa induzir barotrauma ou lesão pulmonar induzida
pela ventilação mecânica. Assim, recomendações para ajustes do ventilador
em pacientes com lesão pulmonar unilateral ainda devem ser estabelecidas. (Blanch,
2003 ).
III. b - Ventilação Independente
A utilização da ventilação mecânica convencional torna-se bastante difícil,
pela lesão unilateral se apresentar de forma assimétrica e heterogênea,
tendendo assim o fluxo inspiratório como a PEEP, serem aplicados no pulmão
menos afetado (menor resistência e maior complacência); sendo assim a ventilação
independente uma opção para ventilar pacientes com esse tipo de lesão, onde
se realiza uma intubação seletiva com uma cânula de duplo lúmen, conectando
o paciente a dois ventiladores sincronizados, que são ligados através de um
cabo sincronizador, que determina que os ventiladores tenham a mesma frequência
respiratória. Os modos ventilatórios utilizados, o tempo inspiratório e os níveis
de PEEP serão adequados a cada pulmão de acordo com as condições mecânicas
destes. Após a melhora do paciente, a cânula de duplo lúmen deverá ser
retirada, recolocando-se a cânula simples e reajustando-se os parâmetros
ventilatórios para a nova situação.(Knobel, 1998).
Resultado: O cenário da ventilação mecânica tem mudado constantemente,
embora não haja um consenso considerado de níveis apropriados de PEEP e VC em
pacientes com lesão pulmonar unilateral. Altos níveis de PEEP em pneumonia
unilateral foram utilizados por Carlon e colab. em 1978, demonstrando que esses
altos valores levam a distensão do pulmão sadio sem abertura dos alvéolos
lesados.Vieira e colab. em 1999, também observaram que PEEP elevada
hiperdistende algumas regiões pulmonares sem reverter colapso, aplicando a
curva PxV em sete pacientes com SDRA com lesão predominantemente unilateral.
Por outro lado, Blanch e colab. em 1992, fizeram uso de PEEP de 5 a 12
cm/H2O em 10 cães, o que mostrou pouca melhora da oxigenação , em função da
baixa pressão utilizada. Já em 2001, Cinnella e colab. demonstraram que
a utilização de ventilação pulmonar independente, com ajustes do VC e
PEEP suficientes para manter pressão platô e de vias aéreas entre 26 cm/H2O
nos dois pulmões em pacientes com trauma torácico unilateral, melhorou a
oxigenação e a relação V/Q bilateralmente.
Há evidências, que o estiramento cíclico e pressões platô elevadas,
associadas a hiperdistensão alveolar podem causar lesão pulmonar induzida à
ventilação mecânica. A preferencial distribuição da ventilação para a
região pulmonar não acometida ocorre pela menor resistência e maior complacência
pulmonar encontradas, provocando hiperdistensão alveolar, enquanto tentamos
minimizar isso através da diminuição da PEEP, podemos promover abertura e
fechamento repetitivo das unidades alveolares. A aplicação seletiva de TGI (
insulflação de gás traqueal ) pode potencialmente eliminar esse problema por
criação de auto-PEEP somente no pulmão lesado (Blanch, 2001). O TGI tem
provado ser um adjunto útil à ventilação mecânica em pacientes com insuficiência
respiratória aguda como demonstrou Blanch e colab. em 2001, utilizando TGI em
um modelo de lesão pulmonar unilateral induzida em oito cães com baixos
volumes e PEEP, apresentando melhora na oxigenação.
A utilização de posicionamento é outra estratégia de tratamento aceita para
melhorar a oxigenação na lesão pulmonar unilateral; foi observado por West,
em 1996, que as regiões dependentes do pulmão ventilam e perfundem melhor que
as não dependentes que estão mais expandidas, em ventilação espontânea.
Baseando-se nesse conceito, Neverin e colab. em 2000, mostraram melhora na
oxigenação no decúbito lateral ventilando 32 pacientes de forma convencional
( VC 6 a 8 ml/kg e PEEP menor que 10 cm/H2O ) fazendo uso de alteração de decúbito.
Bahia e colab. em 2003, avaliaram saturação de oxigênio através da mudança
de decúbito em dez pacientes com lesão pulmonar unilateral em ventilação
espontânea, observando melhora no desequilíbrio V/Q e PaO2 em posição não
dependente.
A lesão pulmonar unilateral promove aumento de secreção traqueo-brônquica,
causando aumento de resistência, dessa forma, Ruiz e colab. em 1999,
investigaram a fisioterapia pneumo-funcional e aspiração isolada em doze
pacientes com insuficiência respiratória em ventilação mecânica,
avaliando-se SpO2 e resistência de vias aéreas, sendo observada melhora na
resistência do sistema respiratório com uso de fisioterapia isolada. Além de
melhorar a resistência do sistema respiratório, a fisioterapia
pneumo-funcional é capaz de reverter rapidamente a hipoxemia causada pela
obstrução das vias aéreas e pelo aumento de secreção, e ainda demonstra
melhora radiológica, na oxigenação e complacência pulmonar.(CBVM,
2000)
Discussão: Recomendações para ajustes dos parâmetros ventilatórios
para pacientes com lesão pulmonar unilateral devem ser bem estabelecidas e
estudos adicionais são necessários para se ventilar esse tipo de lesão sem
causar maiores danos ao parênquima pulmonar. Sabemos que a ventilação
mecânica é um suporte para o paciente com IRpA, mas que sua aplicação
implica em riscos próprios.
Outros recursos podem ser acrescentados junto à ventilação mecânica, como
utilização do TGI que apesar de melhorar a função pulmonar sem efeitos
nocivos, pode trazer riscos na aplicação clínica, sendo necessários mais
estudos que comprovem sua eficácia e segurança.
A ventilação pulmonar independente, apesar de benéfica, pode gerar lesão
traqueo-brônquica, requer uso de dois ventiladores implicando em alto custo,
apresenta ainda dificuldade de aspiração de vias aéreas, além de não poder
ser utilizada por longo prazo.
A eficácia e o valor do posicionamento, principalmente associado a
cinesioterapia pneumo-funcional é bem conhecido e comprovado; a fisioterapia
intensiva prova sua importância no tratamento e manejo de pacientes submetidos
à assistência ventilatória com o crescimento da especialidade e número de
fisioterapeutas que compõem equipes multidisciplinares em unidades de terapia
intensiva, utilizando os recursos do qual possuem para recuperação, melhora na
qualidade de vida e diminuição do tempo de internação.
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